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A conta do lixo já é paga pela sociedade

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Catador. Foto: VladanRadulovicjhb/shutterstock.com

Tem sido cada vez maior o número de especialistas que defendem o que chamam de gestão compartilhada do lixo. A premissa dá conta de responsabilizar diversos atores no processo de gerenciamento dos resíduos, desde a indústria, que deve levar em conta os materiais utilizados nas embalagens de seus produtos, até a população, a partir do que consome.

Fernando Beltrame, sócio-presidente da ECCAPLAN Consultoria em Sustentabilidade e coordenador do projeto Hortas Pedagógicas, da Prefeitura de São Paulo, faz eco à tese. Para ele, que também é idealizador da Campanha “Sou Resíduo Zero”, a conta do lixo já é paga por todos, mas “é essencial criarmos mecanismos para considerarmos os impactos da geração dos resíduos e responsabilizarmos os geradores e consumidores e bonificarmos ou isentarmos os não-geradores”.

Além disso, o especialista acredita que a destinação correta dos resíduos nem sempre está na lista de prioridades de pessoas e empresas “devido à falta de leis restritivas, fiscalização e cobrança por parte do cliente ou consumidor”.

Confira a entrevista na íntegra, a seguir:

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Fernando Beltrame. Foto: Prêmio Eco Brasil 35 anos

Você é idealizador da Campanha ‘Sou Resíduo Zero’, cujo principal objetivo é engajar pessoas e empresas a planejarem e gerenciarem seus resíduos. O que o motivou a tomar essa iniciativa?

A inspiração para criar a Campanha “Sou Resíduo Zero” surgiu numa palestra, na Aliança Resíduo Zero Brasil, proferida pelo Kevin Drew, coordenador do Programa Resíduo Zero Residencial na Prefeitura de São Francisco, na Califórnia. Nesta ocasião, foram apresentados os impactos ambientais e as ínfimas taxas de reciclagem de São Paulo e do Brasil, que não chegam a 2 − 3%, enquanto São Francisco já trabalha com taxas de 80 − 85% de reciclagem e a metodologia e cultura do "zero waste” (desperdício zero em tradução livre).

Em algumas entrevistas você aborda a questão da necessidade de diagnosticar de maneira aprofundada as cadeias formal e informal de reciclagem em São Paulo, para identificar os principais problemas na operação. Na sua opinião, qual o principal gargalo da cidade?

Infelizmente, para a gestão de resíduos acontecer em São Paulo e no Brasil precisaríamos caminhar pelo menos em 4 frentes:

Legal – Hoje, nenhum grande gerador de resíduos (empresa que gera mais de 200 litros de resíduos por dia ou condomínio que gera mais de 1000 litros por dia) ou munícipe é proibido de destinar materiais recicláveis para aterro sanitário, e a compostagem é inviável legalmente. Praticamente 0% dos resíduos orgânicos (cascas de frutas, restos de comida e hortaliças) são reciclados ou compostados, sendo que estes resíduos representam 50% − 60% de todo o resíduo gerado nas cidades, e são 100% recicláveis e transformados em adubo e novos alimentos.

Externalidades e custo para destinar resíduos para aterro – No Brasil, é relativamente barato destinar materiais para aterro, pois não estão computados ou cobrados todos os impactos gerados por estes materiais, seja por seu impacto ambiental (metano, chorume, logística etc.) ou pela perda de grandes áreas para a construção de aterros sanitários.

Baixo valor do material reciclável e obrigatoriedade de reciclagem - devido à não-obrigatoriedade ou fiscalização para a reciclagem de embalagens, paga-se muito pouco pelo material reciclável (o que inviabiliza qualquer processo de separação, transporte e venda de embalagem). Apenas como comparação, o mercado paga apenas de R$ 0,02 a R$ 0,04 o kg do vidro.

Responsabilidade estendida – A Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010, prevê o conceito da responsabilidade estendida, porém este é pouco aplicado ou fiscalizado. Com ele, o produtor ou o importador (denominados poluidores-pagadores) deveriam responder pelo envio apropriado dos rejeitos do que venderem ao consumidor final, incluindo a estruturação da logística reversa – o recolhimento e a devida reciclagem desses produtos pós-consumo –, para que tenham destinação mais adequada que não os aterros. A visão de responsabilidade estendida é adotada em alguns países europeus.

O senhor defende em suas entrevistas a remuneração com o peso do material reciclado e a implantação de coleta seletiva em 100% dos edifícios públicos. Na sua opinião, esses seriam os principais pontos a serem discutidos hoje com o governo para que a cidade avance na coleta de lixo?

Sem dúvida, o reconhecimento, remuneração e valorização do papel ambiental e social da reciclagem é essencial, porém se a Prefeitura avançasse em 2 pontos, todos os outros caminhariam: incentivo à compostagem (representa mais de 50% de todo o resíduo gerado) e proibição do envio de recicláveis para aterro.

No seu ponto de vista, como seria um sistema eficiente de manejo do lixo em São Paulo?

Realizar a coleta domiciliar e privada em 3 tipos: embalagem/reciclável, orgânico (cascas de frutas, restos de comida, hortaliças etc.) e rejeito (papel higiênico, pano de limpeza etc.). Trabalhar a educação, engajamento dos munícipes e empresas para mudar a relação que temos hoje com os nossos resíduos. Como é feito em São Francisco, deveríamos trabalhar a cultura do resíduo zero, para não gerar, reduzir, reutilizar, reciclar, compostar e destinar o mínimo de material para aterro.

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Garrafas plásticas. Foto: Teerasak Ladnongkhun/shutterstock.com

O senhor conseguiu o engajamento de várias empresas na questão da destinação correta de resíduos. Na sua opinião, por que alguns empresários continuam se eximindo da responsabilidade compartilhada dos produtos e da política de logística reversa?

Ninguém é contra as ações ambientais, porém todos temos prioridades e obrigações. Devido à falta de leis restritivas e fiscalização e cobrança por parte do cliente ou consumidor, a destinação correta de resíduos nem sempre está entre as prioridades das empresas e das pessoas.

Alguns especialistas defendem a instituição da taxa do lixo para melhorar a gestão dos resíduos. Na sua opinião, essa pode ser uma saída para que a população se conscientize definitivamente sobre a importância de cuidar do lixo?

Não existe ‘lanche grátis’, todos já pagamos pela destinação dos resíduos. Porém, hoje essa conta é desigual, pois mesmo quem gera pouco resíduo acaba pagando pela pessoa ou empresa que gera muito resíduo. O ônus causado na sociedade é compartilhado, seja para a saúde, ambiente ou social. É essencial criarmos mecanismos para considerarmos os impactos da geração dos resíduos e responsabilizarmos os geradores e consumidores e bonificarmos ou isentarmos os não-geradores.


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