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"O que eu posso fazer para mudar tudo isso?" foi o primeiro pensamento de Ellis França, assistente de diretoria da Escola Municipal Vinicius de Moraes, ao se deparar com 50 sacos pretos de 100 litros com folhas, galhos e raízes. Os resíduos, indispensáveis para o processo de compostagem, eram armazenados pela equipe de jardinagem e dispensados no lixo da instituição. Se é na escola que são dados os primeiros passos do processo de educação, por que não incluir nesta esfera a educação ambiental?
Mais de 60% do lixo gerado nas escolas paulistanas é composto por resíduos orgânicos, enquanto 20% são rejeitos e 15% papel, de acordo com dados publicados no Manual para Gestão de Resíduos Orgânicos nas Escolas, realizado pela ONU e pela ISWA (The International Solid Waste Association), associação internacional que ajuda a gerir os resíduos sólidos no mundo. O material é de 2016 e continua popular entre os pedagogos que desejam seguir um roteiro de sustentabilidade no ambiente escolar.
Seguir o manual foi o começo da jornada da escola localizada na zona Leste de São Paulo, que há quatro anos aceitou o desafio de administrar os resíduos gerados no dia a dia por mais de 600 alunos e 60 funcionários.
“Quando cheguei para trabalhar nesse colégio, essa questão me incomodou muito. Começamos a procurar fórmulas para gerar menos lixo”, conta Elis.
A opção foi entrar no programa Escola Sustentável, um trabalho educativo que visa a mudar o hábito das pessoas acostumadas a misturar o lixo.
O primeiro passo para mudar esse cenário foi recolher os resíduos sólidos. Alunos e professores fazem parte do processo cuidando dos papeis que utilizam durante a aula, material evidenciado com grande desperdício dentro da unidade escolar. “Tem aluno que escreve em apenas uma linha e não utiliza nem o verso da folha. Explicamos a importância de evitar o descarte necessário nas pequenas coisas, como o próprio caderno”, conta Ellis.
Os funcionários da escola também são incentivados a usar menos papel e optam por folhas de rascunho, imprimindo trabalhos na frente e verso do sulfite. O que eles não conseguem mais reutilizar, é colocado em uma caixa de papelão e levado para um contêiner que armazena o lixo reciclável do colégio.
O depósito foi cedido pela Ecourbis, concessionária responsável pela coleta nas zonas Leste e Sul de São Paulo, após solicitação da escola. A unidade assinou um termo de responsabilidade para cuidar do equipamento e, aos sábados, um caminhão da empresa passa para fazer a coleta.
Além da questão do papel, os colaboradores adotaram canecas de metal para evitar o uso de copos descartáveis. A práticas resultaram na diminuição expressiva do número de sacos de lixo por semana na escola, que passaram de 15 para cinco unidades.
“Alguns alunos que se sentiram muito motivados com a reciclagem no colégio e começaram a fazer a separação dos resíduos em casa também. Isso é muito gratificante para nós”, diz a assistente.
O próximo passo foi reduzir o desperdício de alimentos. Dados do mesmo manual mostram que são mais de 245 milhões de refeições servidas anualmente nas escolas públicas da cidade, com um desperdício médio de 134 gramas por prato. Para solucionar o problema, as cozinheiras foram orientadas a aproveitar melhor os alimentos e a escola implantou uma campanha de conscientização. “Tem muita criança que traz lanche industrializado de casa, mas nós estimulamos para que elas comam as merendas saudáveis da nossa cozinha. Assim, além de garantirmos uma alimentação melhor, evitamos mais embalagens”, explica Ellis.
As sobras são levadas pelos funcionários e pelas crianças até os locais criados para o reaproveitamento desses resíduos: a vermicompostagem e as composteiras termofílicas. O primeiro, divido em três caixas do mesmo tamanho, transforma restos de alimentos em adubo por meio da ação das minhocas. Já o segundo atua com a compostagem natural através de uma temperatura que se mantém acima dos 45°C e que garante uma decomposição segura e higiênica dos alimentos.
O sistema termofílico produz um líquido rico em nutrientes para adubar o solo. Todo o processo de transformação leva 120 dias e pode ser abastecido com sobras regularmente. “Essa composteira fica dentro de um barril e tem um encanamento com torneira para dispensar o líquido”, explica a assistente. Rico em nutrientes, ele serve para adubar a horta orgânica da escola que é repleta de variedades de hortaliças: cenoura, espinafre, alface, tomate, rúcula, cheiro verde e muito mais. Todos “fazem a feira” na própria unidade para o preparo do almoço e do lanche das crianças. “Fizemos uma atividade com os alunos em que eles mesmos faziam o sanduíche natural com o que a horta oferece de diversidade de vegetais e legumes”, relembra Ellis.
De acordo com a nutricionista Kamila Nakao, especialista em alimentação infantil, a escolha do colégio em cozinhar as hortaliças orgânicas na alimentação das crianças traz muitos benefícios, como aumento da quantidade de fibras, vitaminas e minerais que é fundamental para o desenvolvimento dos pequenos.
“Ter legumes e vegetais orgânicos também ajuda no aumento da imunidade da criançada e, aliado ao corte de doces, aumenta a capacidade de concentração”, comenta a profissional.
Assim como a horta, o jardim da escola também apresenta diversidade na vegetação. Foram plantadas mais de 75 espécies diferentes pelos próprios alunos e professores. O espaço verde se mantém com o adubo produzido pelo colégio e pelo zelo e cuidado de todos. Ipê amarelo, considerado árvore símbolo do país, pau-brasil, açaí, jabuticabeira e outras variedades são algumas das espécies que crescem no local.
“Comunicamos a Prefeitura Regional de Sapopemba e a Secretaria Municipal do Meio Ambiente que queríamos plantar e eles nos doaram as mudas. Plantar árvores foi uma das ações que mais engajaram os estudantes”, explica a assistente.
A solução para os sacos de lixo que levavam folhas e galhos foi encontrada na cobertura vegetal. Os funcionários da instituição passaram a utilizar o material para tampar os buracos na terra causados pelos escorregadores do parque infantil ou pelas crianças, de tanto pisar nas áreas dos balanços. O objetivo vai além de transformar o lixo da instituição: é também o de incentivar hábitos sustentáveis nos alunos.
O aluno Lucas Fagundes Machado é um bom exemplo de como a educação ambiental adquirida na escola pode mudar os hábitos dentro de casa. Aos 10 anos, ele se motivou a separar ainda mais o lixo depois que sua escola o levou, com outros amigos da classe, à uma cooperativa de catadores na zona Sul da capital.
“O serviço da cooperativa é muito importante para nós e eu acho ruim o Brasil estar entre os países que menos reciclam”, disse o menino enquanto segurava um cartaz produzido por ele com informações sobre os países mais e menos recicladores.
O trabalho da escola foi apresentado por Lucas em um evento sobre resíduos do Colégio Friburgo, uma das dez instituições de ensino brasileiras selecionadas pela Unesco para discutir e propor ações de educação ambiental. “Eu acredito que as atitudes dos pais de separar o lixo dentro de casa, juntamente com a educação ambiental oferecida na escola, ajudam a formar um ser humano melhor e sustentável”, conta a mãe do aluno, Vanesca Fagundes Machado.
Para ajudar na formação dos pequenos, a professora de matemática Patrícia Penteado e outros docentes elegeram os fiscais da sala, crianças que percorrem as classes para saber se os resíduos estão sendo separados corretamente. Assim como ocorre com a falta grave cometida no futebol, a classe que não está destinando o lixo corretamente recebe um cartão vermelho. “Os que fazem a separação certa recebem um cartão verde. Acho que todos querem ser verdes, seja no meio ambiente ou no cartão”, brinca a professora.
Além de separarem o lixo, o hábito de consumo também foi discutido em sala de aula. Cada criança calculou sua pegada ecológica, que são os rastros de consumo que o ser humano deixa pelo mundo. “Um estudante de 10 anos se assustou ao saber que seus hábitos de consumo equivalem a quatro seres humanos na Terra. Por meio dessas atividades práticas conseguimos impactar as crianças e aumentar as chances de termos um adulto consciente”, finaliza a docente.
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