Utensílios para realizar a coleta de materiais. Foto: Thiago Mucci
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A Cooperativa Jardim 5 de julho, que atua no bairro com mesmo nome na zona Leste da capital paulista, começou com uma vocação de criança. O fundador e ex-presidente Edson de Lima Neto, de 39 anos, praticamente nasceu na reciclagem e tomou gosto pelo negócio ainda cedo.
“Meu pai começou a trabalhar com reciclagem em 1979, o ano em que nasci”, conta Edson, que começou a gerenciar sua primeira empresa do setor em 1993, aos 14 anos. “Sempre trabalhei com isso até chegar à fase da cooperativa.”
A história de Edson é repleta de altos e baixos. No começo, o pai, Amauri de Lima - que hoje vive em Santa Catarina e ainda no ramo da reciclagem - chegou a economizar uma boa quantidade de dinheiro com a coleta de resíduos.
No final dos 70, operava com uma Kombi, até chegar a ter dois depósitos – um gerido pelo filho Edson em parceria com um primo, e outro pelo próprio Amauri em sociedade com um tio.
A sede do negócio principal da família funcionava no prédio onde hoje está o galpão da cooperativa – imóvel que atualmente não pertence mais à família e foi alugado pela 5 de Julho sem custos para a Prefeitura.
“Nessa fase inicial, o que eu ganhava com reciclagem aos 15 anos, usava para sustentar a casa com dois irmãos mais novos, pois meu pai havia se separado e eu tinha ficado com a minha mãe e complementava a pensão”, lembra Edson.
O trabalho precoce custou os estudos. Edson não terminou o ensino médio, mas ganhou vivência empresarial. “Parei no segundo colegial porque trabalhava de tarde até a madrugada e dormia na escola”, explica ele.
O olhar empreendedor seria útil após crises econômicas e problemas familiares terminarem os negócios da família, com a venda do prédio do galpão. Era 2009. “Tive que usar a garagem de casa por um ano até alugar um galpão a R$ 800,00”, lembra ele.
O galpão ficava na Vila Carrão e chegou a empregar 14 pessoas. Mas, em 2011, a Prefeitura determinou que o negócio fosse encerrado porque não havia licença e a atividade funcionava na informalidade.
A saída foi recomeçar com a abertura de uma empresa de verdade. Foi aí que ele teve a ideia de alugar o galpão onde havia funcionado a empresa do pai – e onde hoje está a cooperativa.
O negócio andou de 2013 a 2015, quando surgiu a possibilidade de receber cargas da coleta seletiva. “Mas aí precisava ser cooperativa”. Edson reuniu os 14 funcionários e sete toparam montar a associação.
A Jardim 5 de julho é uma cooperativa pequena. Além dos resíduos da coleta seletiva encaminhados pela Ecourbis, não conta com incentivos municipais. Isto é, o aluguel do galpão e as contas de água e luz são financiados pela cooperativa.
Os custos e o lucro são divididos entre os 11 associados – a maioria com baixo estudo e com um histórico que dificultaria o acesso ao mercado de trabalho tradicional. “Não temos mais gente, porque a carga da coleta seletiva foi reduzida de 120 toneladas para 40 toneladas por mês”, explica Edson. “Mas, mesmo assim, a cooperativa cumpre a função de inserção social.”
No dia em que o Recicla Sampa visitou a entidade, não mais havia mais trabalhadores no galpão. “O pessoal foi embora mais cedo, porque o material do dia já acabou.”
Apesar do “pouco material”, os associados conseguem salários que variam entre R$ 800 e R$ 1.200 mensais. Além dos tradicionais vidros, plásticos, metais, papéis e papelão recicláveis no local, a entidade recicla CDs, equipamentos eletrônicos e embalagens com óleo de cozinha usados, que eventualmente aparecem no galpão. Ou seja, não há produção própria.
“Nós temos dificuldades, porque a carga reduziu e não há uma política para favorecer as cooperativas a entrarem em mercados melhores”, diz Edson.
Mercados melhores são empresas privadas, consideradas grandes geradores de resíduos e que pagam empresas, também privadas, para a coleta. “As cooperativas deveriam ter prioridade, porque isso aumentaria nossa receita, geraria inserção social”, defende o fundador. “E o custo para os contratantes seria muito menor, senão gratuito.”
Outro nó que precisa ser desatado é a regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que prevê responsabilidades na logística reversa - cadeia de processos que viabiliza a reciclagem e que está prevista na legislação.
“Você sabia que bandejas de isopor e as embalagens do leite da Shefa (embalado num PET aluminizado) acabam indo parar no aterro sanitário, porque não há mercado de reciclagem para eles?”, indaga Edson ao Recicla Sampa. “A indústria produtora deveria reciclar e recomprar este material, mas não faz e não há compradores. E quem disser que recicla está mentindo, pois isso tudo vai parar no aterro.”
A crítica não é nova. De fato, apesar dos materiais serem recicláveis, as cooperativas visitadas pelo Recicla Sampa dizem que a revenda desses produtos é quase impossível. “Você manda no fardo e os compradores não aceitam”, emenda o fundador da 5 de Julho.
Enquanto os acordos setoriais não resolverem tais questões, o mercado das cooperativas ficará difícil, avalia Edson. A esperança do cooperado é que o quadro seja revertido com o aumento da reciclagem – hoje, São Paulo somente recicla 7% do que produz, um índice que, segundo indicadores oficiais, poderia chegar a 40%.
“Nós temos um papel ambiental importante, mas se continuar deste jeito, vamos ter que acabar fechando, porque vai se tornar inviável. As contas chegam para todos nós no final do mês”, destaca o fundador da cooperativa ao final da entrevista.
A Cooperativa Jardim 5 de julho fica na Rua Freitas Machado, 40 - Jardim 5 de Julho.
Telefone: (11) 98350-9001
Materiais reciclados: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão, CDs, equipamentos eletrônicos e embalagens com óleo de cozinha
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