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A ordem é vencer a guerra da reciclagem

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Foto: Thiago Mucci

A Cooperativa Vitória do Belém parece não ter este nome à toa. Um “pequeno exército” de 15 cooperados, a maioria ex-catadores e carrinheiros, transformou um galpão de mil metros quadrados do bairro num bom exemplo de como é possível vencer pela reciclagem.

É uma equipe de fibra, de sobreviventes cujas histórias caberiam em romances ainda não escritos. A começar pela de Juliana da Silva, uma moça de 33 anos, que casou aos 15 e aos 16 teve que virar carroceira para sustentar as três filhas.

“Depois de ser pizzaiolo e entregador, meu marido virou carroceiro para sustentar a casa porque dava mais dinheiro, mas teve um problema na coluna, que travou, e tive que me virar e pegar a carroça”, relembra. “Cheguei a puxar 650 quilos, com a minha carrocinha, que até hoje me dá saudades.”

Era início da década de 2000. À época, um carroceiro conseguia obter R$ 800,00 de renda – algo em torno de R$ 2.700 corrigidos para valores atuais. Por incrível que pareça, em termos reais, é bem mais que um cooperado ganha hoje. “Nós, mesmo trabalhando com metas e com gestão, fazemos um salário mínimo por cooperado, depois de pagar os custos”. Algo em torno de R$ 940,00.

Juliana hoje é a presidente da cooperativa, onde trabalha com o marido.  Vivem uma realidade dura, e desconhecida da população. Recente pesquisa realizada pelo Ibope para a Ambev indica que a reciclagem ainda é um assunto distante dos brasileiros. Apenas uma em cada quatro pessoas separam o lixo corretamente.

Apesar das dificuldades, o trabalho na cooperativa Vitória do Belém é responsável pelo sustento de mais de dez famílias. No caso de Juliana e de Erivan, o marido, são cinco pessoas – incluindo as filhas de 11, 15 e 16 anos, que estudam e não precisaram ir para a coleta como os pais.

“É por isso que não dá para pensar em logística reversa no Brasil sem levar em conta a inclusão social”, diz a assistente social Camille Oliveira, coordenadora de Projetos Socioambientais da Associação Reciclalázaro. “O que seria destas famílias sem a reciclagem?”

Vinculada à Igreja Católica, a entidade auxiliou na criação da Vitória de Belém e da Recicla Butantã. Também oferece consultoria de gestão para outras 18 das 24 cooperativas cadastradas pela Prefeitura de São Paulo, além de atuar com cooperativas em outros seis estados.

 

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A nova guerra é o preço

Se há uma guerra a ser vencida para que a reciclagem seja conhecida e praticada pela população, há uma outra batalha para que a inclusão social seja de fato um bem tangível. E ela passa pelo preço dos produtos da cadeia da logística reversa.

Juliana, a presidente e ex-carrinheira, cursou até a oitava série, mas aprendeu a fazer contas e entendeu a crueldade da economia de escala. “Temos hoje muitos atravessadores, que pagam pouco pelos materiais que vendemos”, diz Juliana. “Isso porque há indústrias que só aceitam comprar em grande quantidade, o que consideramos errado.”

É bom lembrar que, em termos de mensuração, a produção de lixo, rejeitos e bens recicláveis são contados aos milhões de toneladas. Só na Vitória do Belém são de 20 a 50 toneladas por mês, algo ínfimo no universo paulistano e nacional, mesmo sabendo-se que a cidade só recicla 2% do que deveria.

Parece pouco, mas duas toneladas de papel não são suficientes para que uma empresa se interesse em comprar diretamente. Só aí, há uma variação “de R$ 0,65 para R$ 0,45” no quilo pago à cooperativa – nada menos que 40% que ficam com o atravessador.

Mas há batalhas ganhas. Algumas empresas já começaram a praticar uma política social na compra. “A Novelis (empresa do setor siderúrgico) compra em qualquer quantidade nossas latinhas e isso tem que ser divulgado porque é uma política de impacto social”, diz.

Quem não chora...

A Vitória do Belém ainda engatinha em termos de cooperativismo. Vai fazer cinco anos o mês que vem. “A fundação foi em julho, mas começamos a trabalhar na prática em outubro de 2013, depois de um treinamento em gestão ministrado pela Reciclalazáro.” São, portanto, dois aniversários.

Como toda a criança, é preciso “chorar” para ser ouvido. Em termos práticos, buscar clientes e não apenas depender do lixo da coleta seletiva.

“Nós acabamos de comprar uma Kombi que faz coletas a domicílio num raio de cinco quilômetros”, explica a presidente. “E temos empresas parceiras, como uma agência do Banco do Brasil e o pessoal do bairro, que acaba nos pedindo para buscar os materiais.” 

Este trabalho rende 8 toneladas/mês ou cerca de 30% do que a cooperativa angaria. O restante é trazido pelos caminhões da coleta seletiva da Loga, uma das duas concessionárias da limpeza urbana da capital, leva à cooperativa.

Formação humana

A meta da Vitória é crescer para aumentar a renda média por cooperado. Cada um deles ganha por hora trabalhada e tem metas diárias para bater – três fardos prensados de qualquer material. Mas não é só. É preciso capacitação constante.

As atividades incluem uma hora extra para um curso semanal de alfabetização, ministrado pelo Instituto Paulo Freire com patrocínio da Samsung, além de reuniões periódicas para reavaliação de procedimentos.

Dona Edileuza da Silva, uma das cooperadas que atuam na esteira mecânica separando o que presta ou não para a reciclagem, só aprendeu a ler agora, depois de uma vida barra-pesada que ela deixa entrever em monossílabos – os cooperados são tímidos e demoram a se abrir.

Ela veio de Belo Jardim, no agreste pernambucano, ainda menor de idade para São Paulo. Teve problemas com o companheiro e ficou mãe solteira de dois filhos, um rapaz e uma moça – esta também cooperada. “Agora, aprendi a fazer meu nome direito; antes fazia errado."

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Juliana da Silva, presidente da cooperativa. Foto: Thiago Mucci

Pensando em todos os Rs

Os cooperados também foram treinados a pensar em todos os 5 Rs. “Nós aqui não apenas reciclamos o que vem da coleta”, diz Juliana. “Temos água de reúso”.

Ela conta que, hoje, boa parte dos profissionais da reciclagem, mesmo sendo composta por gente pobre, é consciente do valor ambiental inerente ao trabalho. “Antes, quando era carrinheira, fazia só para sobreviver, mas hoje penso no planeta.”

Parte da missão da presidente é receber visitas monitoradas de escolas e empresas, todas as quintas-feiras. Um trabalho que mistura relações públicas e educação ambiental.

“Eu digo às crianças que, se nós não cuidarmos do que jogamos fora ou desperdiçamos, vamos acabar criando uma montanha de lixo que vai chegar ao céu.”

A presidente lembra que até o esgoto produzido na cooperativa, localizada em área que faz fronteira com a Marginal do Tiete, é biotratado por um sistema que usa plantas antes de ser enviado à Sabesp para o tratamento final. Não sem uma dose de ironia, ela encerra a entrevista: “Aliás, podiam fazer isso com todo o Tietê.”

Serviço

Quem quiser contratar a Vitória do Belém pode telefonar para 2509-6358.


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