29 de Abril de 2019,12h20
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Foi no Albergue Municipal da rua Cardeal Arcoverde, em Pinheiros, zona Oeste de São Paulo, que o catador Antonio Adriano Alexandre, 47, recebeu a notícia que mudaria a sua vida. Um curso de capacitação para catadores estava sendo oferecido pela Prefeitura da capital para aqueles que desejavam sair da informalidade, o Reciclar para Capacitar.
Com apenas 14 anos, Antonio saiu do Ceará em companhia da tia rumo à São Paulo para conhecer sua mãe de sangue. Chegando à terra da garoa, morou em Osasco, cidade em que também conheceu sua esposa, com quem está junto há mais de 20 anos e tem dois filhos, Pablo e Katelin.
Azulejista, gesseiro e pintor certificado pelo SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), teve seu primeiro contato profissional com o lixo no aterro sanitário de Itapevi, que antes da regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos era um lixão a céu aberto. Antonio conta que teve outras oportunidades na época, mas era dos resíduos que retirava dinheiro para o sustento da família.
“Tirava em média 400 a 500 reais e eles pagavam toda semana. Eu separava o material reciclável e já vendia lá mesmo”, diz.
Por medo da violência na capital, que já tinha levado seu irmão e seu cunhado, Antonio e sua esposa decidiram mudar para o Paraná. No Sul, teve a oportunidade de trabalhar com a separação de resíduos em duas grandes empresas da região. Porém, as coisas não se encaminharam como o planejado. “A situação começou a apertar quando fui mandado embora. Sem encontrar serviço por lá, resolvi voltar para São Paulo. Minha família ficou”, conta.
De volta à megalópole há três anos, Antonio voltou a viver do lixo. Todos os dias ele fazia tudo sempre igual: às seis da manhã já estava em pé para puxar sua carroça no bairro de Pinheiros. “A gente já tinha lugar marcado. Os estabelecimentos ao redor e as pessoas que andavam na região ajudavam e indicavam onde eu podia deixar a carroça”, conta.
Mesmo com a mãe morando na cidade, optou por viver em um albergue. O ‘Albergue da Cardeal’, como ele mesmo apelidou e viveu durante algumas semanas, abriga pessoas em situação de rua e traz informações aos acolhidos sobre oportunidades de tratamentos e reinserção na sociedade, como o programa Reciclar para Capacitar.
“Eu me interessei pelos benefícios oferecidos e fui fazer o curso. Sair dele empregado seria um sonho e que se tornou realidade”, conta o catador. O programa é uma iniciativa da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb), que visa a formalização de 2.120 catadores atuantes no município.
Com aulas teóricas e práticas, os alunos recebem um kit alimentação e uma bolsa auxílio, além de um certificado emitido pela Fundação Instituto de Administração (FIA). O projeto ofereceu a oportunidade para Antonio participar do processo seletivo e ser contratado pela Green Mining, uma empresa que atua na recuperação de garrafas de vidro em bairros da capital.
Resultado de um programa de aceleração da Ambev, o Green Mining foi um dos três projetos brasileiros selecionados pela companhia de bebidas para suprir os Objetivos de Sustentabilidade 2025 da multinacional, que inclui dez desafios em prol do meio ambiente. "Nosso objetivo é atender a meta que determina que 100% dos produtos da empresa devem estar em embalagens retornáveis ou feitas majoritariamente com conteúdo reciclado", explica Rodrigo Oliveira, CEO da Green Mining.
Por meio de um sistema com algoritmo próprio é possível mapear, de acordo com dados de venda da indústria, onde estão os pontos de concentração de embalagens pós-consumo. "Instalamos nossos HUBs, que nada mais são do que estacionamentos com containers nos locais apropriados e colocamos nossos coletores para pegar os resíduos recicláveis nos bares, restaurantes, padarias e qualquer lugar da região que gere muito vidro", explica Rodrigo.
Atualmente, a operação é realizada nos bairros Vila Olímpia e Pinheiros, e a expectativa é chegar a 1.010 pontos só em São Paulo. Todo material coletado pela Green Mining vai para a usina de reciclagem de vidro da Ambev, no Rio de Janeiro, onde é reinserido no processo de produção. Quanto aos catadores, Rodrigo afirma que a expectativa é alta.
“A previsão a longo prazo é de contratarmos cerca de 2 mil colaboradores formados pelo projeto Reciclar para Capacitar. Se as empresas entenderem que dá para manter ou até aumentar sua lucratividade resolvendo questões ambientais, implementando a logística reversa e ainda gerando emprego e renda para essas pessoas, o ciclo se fecha”, defende.
Um dos profissionais que hoje faz esse serviço é o Antonio. "Nosso primeiro catador que virou coletor", diz Rodrigo. Hoje, com regime de contratação CLT, um triciclo devidamente adaptado e morando na casa de sua mãe, Antonio está de volta à sociedade. “Estou bem, formado, quero trazer minha esposa e meus filhos que não vejo há três anos para São Paulo e tenho o objetivo de crescer junto com a firma, tirando minha renda do lixo”, conta.
A história de Antonio é o resultado do que o Reciclar para Capacitar visa: inserir o catador no mercado de trabalho trazendo formalidade e dignidade para a profissão. "O Antonio mudou totalmente de vida. É isso que queremos para os demais capacitados", reforça o engenheiro Túlio Barrozo Rossetti, gerente de Informação e Pesquisa da Amlurb.
Texto produzido em 17/04/2019
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