Cooperativa. Foto: Buquet Christophe/shutterstock.com
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Em uma megalópole como São Paulo praticar a reciclagem vai além da defesa do meio ambiente. Reciclar também é um meio de promover o emprego, a renda e a solidariedade, já que muitos tiram do lixo a oportunidade de sobrevivência.
Em decorrência da informalidade, fica difícil mensurar o número de trabalhadores que atuam nessa área. Das cerca de 100 cooperativas que atuam com o lixo reciclável na cidade, 24 são habilitadas pela Amlurb (Autoridade Municipal de Limpeza Urbana), instituição ligada à Prefeitura e responsável pelo gerenciamento da operação de coleta seletiva no município.
A autarquia disponibiliza, para os cooperados credenciados, equipamentos de segurança, uniformes, IPTU, água, luz, caminhões e galpões próprios ou locação para a realização do trabalho.
A comercialização do lixo acontece livremente pelos cooperados e sempre com a auditoria da Amlurb. A exigência é de que parte da renda seja investida na educação e saúde dos funcionários. “A receita pela venda dos materiais pertence integralmente a eles”, explica Monty Dahan, chefe da Diretoria de Planejamento e Desenvolvimento da Amlurb.
Foi a formalidade que possibilitou que 53 pessoas da Cooperativa Chico Mendes recebessem, em média, um salário mínimo. “Todos contribuem com o INSS”, conta a presidente, Dulce Alves de Almeida. Já a Cooperativa Vira Lata paga mais de um salário mínimo para os funcionários. O fundador, Wilson Santos, afirma que R$ 1.500 é a média salarial.
Para o futuro, as ações relacionadas às cooperativas tendem a melhorar. A Amlurb pretende firmar convênio com o Ministério do Trabalho para treinar e preparar mais catadores avulsos. “A ideia é que entendam melhor o que é a coleta. Assim, talvez, consigamos trazer para o campo da formalidade 1.400 catadores”, explica Monty Dahan.
Ainda este ano, a instituição também planeja universalizar a coleta seletiva na capital, realizada pelas concessionárias de limpeza Loga e Ecourbis. Um serviço parcial, que hoje cobre 50% dos domicílios dos 96 distritos da cidade.
“Em breve será possível recolher o lixo reciclável em todas as ruas em que os caminhões consigam circular. Além disso, queremos implantar a coleta seletiva nos prédios públicos da capital”, complementa.
Muitos moradores da cidade já se conscientizaram de que o descarte correto do lixo pode gerar empregos e renda. É o caso da empresária Juliana Amano, residente no bairro Butantã, onde mantém sua cozinha industrial. Toda semana, as caixas de plástico e de papelão utilizadas na sua empresa são destinadas para um senhor do bairro que sobrevive da reciclagem.
“Eu sei que, para ele, o lixo tem valor. Já que não conseguimos diminuir o consumo, temos que cuidar um pouco mais do lixo”, diz.
A cirurgiã-dentista, Andréa Gotardo, compartilha do mesmo sentimento. Ela acredita que não se deve descartar algo que outra pessoa pode aproveitar e tem consciência de que os cidadãos podem gerar um volume de materiais recicláveis para alimentar os trabalhadores das cooperativas.
Os cooperados agradecem a conscientização da população e reforçam que é preciso desmistificar a palavra lixo, terminologia que indica, erroneamente, que algo não pode ser reaproveitado. A presidente da Cooperativa Central Tietê, Maria de Lourdes Ribeiro Augusto, comprova isso em seu dia a dia de trabalho. Para ela, nada é lixo. “As pessoas precisam parar de achar que recicláveis não servem para nada”, enfatiza.
Hoje o papel da reciclagem ocupa outros patamares. Reciclar se tornou uma forma de transformar sonhos em realidade. Trabalhar com reciclagem concretizou o desejo da casa própria de Ede Carlos Almeida, funcionário da Cooperativa Coopercaps. “Saber que um teto é seu e ninguém pode te tirar, não tem preço”, orgulha-se. Ele ainda ressalta que atualmente existe um respeito e um reconhecimento maior em relação ao catador, pois as cooperativas organizaram os trabalhadores.
Segundo dados oficiais, a cidade recicla somente 7% do total de descartes produzidos, mas pode chegar a 40%. Reverter este quadro depende fundamentalmente de uma mudança de atitude de cada cidadão.
O superintendente operacional da Ecourbis, Walter de Freitas, afirma que o principal problema da coleta seletiva ainda é a baixa adesão da população. “A maioria das pessoas ainda não sabe reciclar. Nós já chegamos a receber animais mortos dentro dos sacos”, conta.
Walter também acredita ser fundamental pensar nos 5Rs da sustentabilidade para evitar o desperdício e contribuir com as pessoas menos favorecidas: repensar, recusar, reduzir, reutilizar e reciclar. “Quando a população tiver consciência, as coisas vão melhorar, a reciclagem aumentar e os materiais serão disponibilizados adequadamente”, conclui.
A conscientização ambiental deve começar na infância. É o que afirma a professora da Up School, Thalyta Turbuk. Ela conta que, na escola, acredita-se na importância da reciclagem desde cedo e as crianças são incentivadas a separar e reutilizar o lixo. “Pensamos num bem maior e na nossa sociedade”, enfatiza.
Não foi a escola, mas um curso de artesanato que fez aos 14 anos o responsável por inspirar Thais Verçosa, moradora da capital, a se interessar pela primeira vez em reciclar algo. “Descobri que, do lixo, eu retirava a matéria-prima a baixo custo necessária para a realização dos trabalhos e sem impactar a natureza. Temos que mudar nossa cabeça. É um desperdício tremendo tratar o lixo de forma displicente”.
O engajamento na causa foi além do trabalho. Recentemente, Thais vem atuando em um projeto de hortas orgânicas em uma praça próxima à sua residência, no Alto da Lapa. “Em casa eu também faço compostagem e o material excedente eu levo para lá”.
A presidente da Cooperativa Cooperpac, Helena da Silva Novaes Oliveira, incentiva a iniciativa. A preocupação dela e de sua equipe é com a educação ambiental. “As pessoas têm que aprender desde cedo. Elas sabem muito pouco sobre reciclagem e meio ambiente. Deveriam ser mais participativas”, lamenta.
Muito mais do que um papel econômico, a reciclagem tem hoje um caráter social, ajudando pessoas a se reinserirem na sociedade. “Nós estamos com 76 usuários de droga, ex-moradores de rua, dentro de uma casa de recuperação. Sem ter como sustentá-los começamos a fazer um trabalho social”, explica Elineia de Jesus, presidente da Cooperativa Rainha da Reciclagem.
Até hoje a cooperativa conseguiu recuperar 400 pessoas. A funcionária Maria de Fátima Libério dos Santos é a prova dessa reintegração. Ela é ex-garota de programa, ex-moradora de rua e ex-dependente química. Uma verdadeira sobrevivente.
“Aqui eu descobri que não só o lixo é reciclável, mas nós, como seres humanos, também somos”.
Cooperativa Coopercaps: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão
Cooperativa Rainha da Reciclagem: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão
Cooperativa Chico Mendes: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão
Cooperativa Vira Lata: papéis, vidros, plásticos alumínio e sucata ferrosa
Cooperativa Cooperpac: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão
Cooperativa Central Tietê: papel, plásticos (todos), vidros, metais comuns e papelão
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