28 de Agosto de 2020,10h00
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Pode parecer estranho, mas se não bastasse o lixo gerado na Terra, o ser humano também está deixando resíduos no Universo. Isso mesmo! Esses são os chamados lixos espaciais, muitas vezes confundidos com estrelas cadentes e até disco voadores.
Para explicar sobre esse fenômeno que está em órbita, o Recicla Sampa convidou o físico Gustavo Rojas para um bate-papo.
O profissional é formado pela USP (Universidade de São Paulo) e tem passagens por universidades europeias. Ele também é membro da comissão organizadora da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), que acontece nas escolas e envolve cerca de um milhão de estudantes por ano.
Gustavo gosta tanto de astronomia que, quando criança, ao invés de colecionar figurinhas de jogadores de futebol, ele gostava mesmo era de reunir planetas. Com os anos, o interesse se transformou em objeto de estudo e, hoje, faz ele ser reconhecido como um especialista no assunto.
Segundo ele, os lixos espaciais podem ser vistos da Terra e, por isso, às vezes causam confusão. “Eles passam piscando pelo céu e, por isso, muitas vezes são confundidos com discos voadores.
Leia a entrevista com Rojas na íntegra:
Gustavo, afinal, o que é lixo espacial?
Lixo espacial é um termo usado para qualquer tipo de material que é produzido pelo homem e que está em órbita terrestre, ou seja, que está no espaço, ao redor do nosso planeta. A origem desse material é basicamente fruto da exploração espacial. Qualquer foguete que é lançado para colocar algo em órbita, seja satélite ou outros instrumentos, acaba gerando um resíduo no espaço.
Entende-se por satélite qualquer corpo colocado em órbita ao redor da Terra. Já foram feitos milhares de lançamentos desses objetos, mas a maioria encontra-se desativado. Quando os lançamentos ou o próprio satélite possuem falhas, eles ficam orbitando pelo planeta por tempo indeterminado, constituindo também um lixo espacial.
Como a exploração espacial acontece há mais de 60 anos e o homem lança coisas no espaço desde então, há uma grande quantidade de detritos provenientes dessa jornada espacial.
A Terra está cercada por esse lixo espacial ao redor dela?
É muito espaço que se tem em órbita terrestre – lembrando que órbita terrestre é a trajetória em forma de elipse alongada que a Terra percorre em torno do Sol por conta de sua atração gravitacional. Nós, cientistas, estamos acostumados a ver representações da Terra com um monte de pontinhos em volta, mostrando a distribuição desses lixos.
Na figura, isso fica muito exagerado. Temos que lembrar que a Terra é um planeta muito grande. Ela tem 13 mil quilômetros de diâmetro e todo esse lixo está espalhado numa órbita que é muito maior que o nosso planeta. Esses fragmentos não são muito grandes. A Terra, especificamente, não está cercada por tanto lixo espacial, se não a gente não conseguiria nem ver a luz do sol direito, estaria bloqueada.
Porém, eles existem. O espaço é bastante vazio na órbita terrestre, mas ele está repleto de milhares de detritos. Nós, cientistas, temos que nos preocupar com isso, pois eles podem atingir algum satélite ativado que serve de base de estudo ou trabalho para algum cientista em nosso planeta ou até mesmo entrar na superfície terrestre.
E o lixo espacial pode atingir alguém na superfície terrestre?
É difícil eles chegarem até a Terra, mas acontece. Tem até um caso que ocorreu de uma estação espacial chinesa que estava desativada, a Tiangong-1, que retornou para a superfície da Terra.
Hoje em dia, tudo que é lançado em órbita tem que possuir um plano de reentrada na Terra, caso isso aconteça. O equipamento que está em órbita, se não for feito nada com ele, lentamente ele diminui sua altitude. Depois de 20 ou 30 anos, a altitude pode estar tão baixa que ele pode cair no planeta.
Ele cai com qual velocidade?
Em torno de 40 mil km/h, realmente é muito rápido. Como ele penetra na região mais densa da atmosfera, será freado. Justamente por isso, toda essa energia que ele tinha da alta velocidade se transformará em uma energia térmica, ou seja, o objeto vai queimar.
Ele cairá na Terra como uma bola de fogo? Como a gente costuma ver em filmes de ficção?
Exatamente, ele cai em formato de bola de fogo. Eu acho que filme é meio exagerado, mas a ideia é parecida. Pode acontecer de alguns fragmentos serem mais resistentes a altas temperaturas e sobrar partes do equipamento. Isso já aconteceu no passado, algumas vezes, na década de 70, onde uma estação espacial chamada Skylab chegou a atingir o solo.
Mas na maioria das vezes, cai no oceano. Como 2/3 da superfície da Terra está coberta pelo mar, a chance maior é de cair na água e ninguém nunca vai ficar sabendo. Mas, às vezes, pode ocorrer de cair no solo e foi isso que aconteceu na Skylab. Alguns pedaços caíram na Austrália. Não houve prejuízo, porque felizmente não pegou em nada e não atingiu ninguém.
Com a estação chinesa, a Tiangong-1, havia essa preocupação de cair em algum local fora da água, mas caiu no oceano Pacífico. Não houve vítima. Quer dizer, não sei se atingiu algum peixe (risos).
Em resumo, o que acontece é isso: eventualmente esses objetos retornam para a Terra, atravessam a atmosfera, ficam expostos a um grande calor, vão queimar e pode ocorrer de cair um pedacinho de detrito. A chance de atingir algo, uma construção ou uma pessoa é muito baixa. Mas reitero: não é porque é muito baixa que não pode acontecer. É uma chance muito pequena, mas que não é zero. É por isso que temos que monitorar esses objetos que estão em órbita.
Se algum detrito atingir um satélite, isso pode prejudicar o trabalho de algum cientista ou astronauta?
Sim. Tudo que está em orbita move-se em uma velocidade muito alta. São milhares de quilômetros por hora. O objeto pode circular a aproximadamente 40 mil quilômetros por hora. No impacto com um satélite ativo, essa velocidade causa um estrago considerável, mesmo se for um detrito com uma massa muito pequena, como por exemplo, um parafuso.
Há registros de satélites e também de espaçonaves como ônibus espaciais ou estações espaciais internacionais (laboratórios de astronautas) que foram atingidas por esses fragmentos e sofreram danos. Não dá para mapear todo o lixo espacial. Nós mapeamos aqueles objetos que são maiores, mais fáceis de se localizar aqui da superfície terrestre. Esses que são muito pequenos, como parafusos, não tem como.
Apesar da probabilidade de acontecer ser muito baixa, se ele impacta algo, o estrago é considerável. Principalmente quando têm vidas humanas envolvidas, como no caso de algum astronauta estar fazendo alguma atividade fora da estação espacial ou até mesmo uma tripulação dentro da nave. No caso de algum problema estrutural ou de emergência, eles precisam voltar imediatamente para a Terra.
Já aconteceu na história da exploração espacial de algum astronauta que está trabalhando fora da nave ser atingido por um lixo espacial?
Ele não somente pode ser atingido por lixo espacial, mas também por micrometeoritos, que são pequenos fragmentos de rochas que existem no espaço. Isso nunca aconteceu. Nenhum astronauta foi atingido até hoje. A probabilidade é bastante baixa, mas existe uma pequena chance de isso acontecer.
É verdade que os astronautas precisam planejar o que vão deixar de detritos no espaço? Por que?
Sim. Porque esse espaço que é perto da Terra, o que chamamos de órbita baixa, tem 500 km de altitude aproximadamente. Essa região é a mais ocupada pelos satélites. Existe uma grande quantidade de objetos que estão nessa órbita. Se há algo que penetra nessa orbita sem estar planejado, isso pode causar um problema como uma colisão.
É como se fosse um tráfego de aviões. Os aviões estão no ar e estão em várias altitudes que eles podem circular para que não colidam uns com os outros. E com o satélite acontece a mesma coisa.
São milhares de satélites. Existe até um programa de monitoramento para mapeá-los. E, além deles, têm fragmentos de foguetes que foram deixados. Nós temos que ficar rastreando.
Dá para achar lixo espacial quando olhamos para o céu?
Pouca gente sabe, mas dá para ver esses detritos passando pelo céu. Aqueles que são muito grandes vão refletir mais a luz do sol. Há alguns que refletem tanto que você consegue ver a olho nu. Para ver, você tem que estar em um local onde o céu é muito escuro. Em São Paulo e em grandes cidades não será possível observar. Mas, se você for para um local afastado, como uma fazenda ou uma praia, dá para enxergar. Depois que o sol se põe, hora que está escurecendo e as estrelas começam a aparecer, ou antes do amanhecer conseguimos ver pontinhos luminosos se mexendo no céu. Não são naves alienígenas, são satélites e também fragmentos de foguetes.
Existem aplicativos que informam quando passará esse fragmento, qual o brilho que ele terá e que trajetória ele fará no céu. É algo bem divertido para quem gosta de olhar para o céu. É possível fazer uma caça ao lixo espacial daqui da Terra com segurança. Às vezes, tem gente que acha que é um avião ou uma nave alienígena, mas é só um lixo espacial passando mesmo.
Existe um aplicativo que mostra quando os lixos espaciais podem ser vistos do céu?
Sim, vários. Eu gosto de um aplicativo chamado Heavens-above. Ele é feito na Alemanha. Tem também um site. Ele sabe onde você está por causa do GPS do seu celular. Com a internet, ele vai descarregar a previsão de passagem desses fragmentos. Ele tem até um mapinha do céu para você tentar se localizar e saber a direção que eles passarão,
Só por curiosidade, o objeto mais brilhante artificial que dá para ser visto do céu é a Estação Espacial Internacional. Ela consegue ser tão brilhante quanto o planeta Vênus. Exemplifiquei só para dizer que a ideia é a mesma. Se você consegue ver a Estação Espacial, dá para enxergar um lixo espacial.
Existe uma preocupação em retirar esses lixos espaciais da órbita?
Existe, porque se nada for feito o excesso de fragmentos dificultará o espaço físico para novos satélites. Não é algo fácil, como se fosse chegar um astronauta com um aspirador de pó gigante. O espaço na órbita é muito vasto. Esse lixo está espalhado por muitos lugares. Existem planos e ideias para retirá-los. A maneira mais fácil para não ter esse lixo é programar a volta dos satélites que não têm mais vida útil para a Terra. Na trajetória, ele deve ser queimado completamente.
Essa é uma norma espacial que existe há algum tempo. Tudo que é lançado em órbita, deve ser redirecionada de volta para a Terra para que seja queimado com o impacto. Existem algumas ideias para remover o lixo espacial como uma nave que atraia esse tipo de objeto ou uma super rede ou algo a laser para diminuir o tamanho.
Se uma pessoa se interessar por assuntos espaciais e astronomia, por onde ela deve começar a pesquisar?
Para quem ainda é estudante, existe um evento chamado Olímpiadas Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA), todos os anos, em maio, os alunos fazem uma prova para testar seus conhecimentos no assunto. Para quem tiver interesse em expandir esse assunto com crianças nas escolas, a OBA é uma excelente porta de entrada para descobrir mais recursos sobre este tema tão interessante.
Entrevista produzida em 09/05/2019
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